abril 20, 2009

João Pereira Coutinho

João Pereira Coutinho é cronista português e escreve semanalmente na Folha de S. Paulo

Qual sua opinião sobre o acordo de unificação ortográfica?
Sou contra. Visceralmente contra. Filosoficamente contra. Linguisticamente contra. Começo por ser contra com a força das minhas entranhas: sou incapaz de aceitar que uma dúzia de sábios se considere dona de uma língua falada por milhões. Ninguém é dono da língua. Ninguém a pode transformar por capricho. Por capricho, vírgula: por mentalidade concentracionária, em busca de uma unidade que, para além de impossível, seria sinistra. A língua é produto de uma história; e não foram apenas Portugal e Brasil que tiveram a sua história, apresentando variações fonéticas, lexicais ou sintáticas; a África, Macau, Timor e Goa, que os sábios do Acordo ignoram nas suas maquinações racionalistas, também têm direito a usar e a abusar da língua.

Como você toma a reação dos portugueses ao Acordo?
Os portugueses não têm posição sobre o Acordo; é um assunto que não existe na sociedade portuguesa.

É verdade que os portugueses consideram que o Acordo é uma tentativa de abrasileiramento da língua portuguesa?
Alguns portugueses, sim: entendem o Acordo como uma intrusiva colonização brasileira da língua. Mas os meus pontos de discórdia não lidam com essa preocupação.

Os portugueses sentem, em alguma medida, que seu idioma se encontra isolado na Europa?
Pelo contrário: os portugueses alimentam a crença, obviamente infantil, de que pelo fato de falarem português, são também capazes de falar espanhol ou italiano.

Como avalia a língua portuguesa no cenário internacional?
A língua, normalmente, acompanha o crescimento econômico dos povos que a falam. Existem exceções, claro (China, mandarim). Mas se o inglês é a língua franca, isso deve-se à supremacia econômica da Inglaterra (século 19) e dos Estados Unidos (século 20). Se o português será uma língua importante no futuro, isso dependerá, essencialmente, do papel econômico do Brasil no mundo.
Trecho da entrevista publicada na Revista Língua Portuguesa n.42/ abril 2009

Um comentário:

Anônimo disse...

Que lúcido! Gostei dele e das respostas!

Viva a língua brasileira .-D (em terra de cegos, quem tem um olho é rei)

Vinícius